É impossível pensar a cultura urbana contemporânea sem fazer referência a Paul Virilio. Filósofo e urbanista, que faleceu no dia 10 de setembro, Virilio se dedicou a investigar as implicações políticas e sociais da aceleração do cotidiano

No seu livro Velocidade e Política, dos anos 1970, ele mostrava como a velocidade havia se convertido em um valor, sendo mais relevante a velocidade de destruição do que a de produção. Nesse contexto, o presente torna-se a categoria fundamental em um mundo que se contrai e encolhe pelo avanço das tecnologias de informação que aproximam todos os lugares.

Segundo Virilio, a aceleração crescente da vida aboliu a noção de passado. Se antes falávamos de passado, presente e futuro, hoje só existiriam dois tempos: um passado recente e o tempo real, sendo o futuro um tempo das máquinas e das lógicas de programação.

Crítico mordaz da Internet e de suas utopias, Virilio chama a atenção para como essas transformações, mobilizadas pelo avanço das telecomunicações e da revolução digital, impactam nossa experiência cultura e as dinâmicas sociais. Em uma longa entrevista publicada pela excelente revista Semiotext(e), que resultou no livro A Administração do Medo, comenta a explosão das redes sociais e dos celulares.

Virilio afirmava que, graças ao celular, “o sedentário contemporâneo é alguém que se sente em casa em qualquer lugar” enquanto que o nômade, nesse mundo de novas tecnologias, “em que carregamos a cidade conosco”, tornava-se o excluído, aquele que desprovido de acesso à conexão, vive na condição de ostracismo.

É curioso pensar que perdemos Virilio na mesma semana em que a revista Wired, uma das publicações mais afinadas com a visão utópica da Internet, completa 25 anos, celebrando a miragem da potencia das novas tecnologias para construir um mundo melhor.

Em dissonância com a euforia da cultura do compartilhamento, Virilio alerta para o quanto as redes sociais impondo uma espécie de “comunismo privatizado”, fomentando uma cultura que troca a noção de identidade pela de rastreabilidade.

Afinal, vivemos sob vigilância constante, sendo olhados, escaneados, e nos revelando cada vez mais. E aceitando tudo isso, como uma sina, um destino do progresso da nossa época. Mas promover o progresso, diz Virilio, nos faz sentir que estamos sempre para trás. Há sempre atualizações por fazer, no perfil do Facebook, nos equipamentos, nas respostas de email. Em outras palavras, nos condicionamos, como ele diz, a viver “um masoquismo diário e sob constante pressão.”

A pressão do tempo da minha coluna na Rádio USP não permitiu me alongar mais sobre a obra de Paul Virilio. Para saber mais sobre o filósofo, recomendo assistir a gravação de suas conferências, disponíveis aqui.

Transcrição da coluna Ouvir Imagens, de Giselle Beiguelman, veiculada toda segunda-feira, às 8:00, pela Rádio USP (93,7).

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