O rompimento da barragem em Brumadinho impactou o País e o mundo pelas suas dimensões trágicas, mas também porque é um acontecimento que deixa e revela profundas marcas da nossa experiência cultural.
Os registros feitos por moradores e sobreviventes, intensamente replicados nas redes, por meio de vídeos, fotos e depoimentos, nos transformaram em testemunhas de um crime ambiental que tomou as proporções de uma catástrofe.
Diferentemente das ruínas, que projetam no futuro um movimento de volta a um passado que pode nunca ter ocorrido, a imagem da catástrofe é antecipadora. É um alerta, um alarme. Ultrapassa a medida da natureza e transcende a escala humana. A ruína é local, a catástrofe é planetária.
Não podemos deixar de mencionar que estamos falando aqui de um acidente trágico que vem na sequência de um outro, muito recente, ocorrido há apenas três anos, em Mariana…
Mariana e Museu Nacional
Eu temo que ocorra algo semelhante ao que ocorreu com o Museu Nacional. Lamentado à exaustão nos primeiros dias, foi muito rapidamente esquecido do noticiário e das conversas que tomaram o país. Durante uma semana, fomos inundados pelos registros do Palácio bicentenário que o abrigava, ardendo e sucumbindo à fúria do fogo.
Contudo, o tom de consternação geral pela perda do inestimável patrimônio de 20 milhões de itens – o quinto maior museu em acervo do mundo – não escondia certa hipocrisia estrutural. Em meio à lamúria coletiva, descobria-se que, enquanto o Museu esteve aberto, era um ilustre desconhecido do público.
Ou seja, o esquecimento de Mariana não é revelador apenas da debilidade de nossas políticas ambientais, mas também da fragilidade de nossa memória coletiva, da nossa responsabilidade social. Precisamos urgentemente reavaliar as licenças ambientais e criar medidas que assegurem a população e a biodiversidade, mas não podemos nos furtar de preservar a memória desses acontecimentos traumáticos. Caso contrário, só teremos espaço para a catástrofe que, no século 21, pode não ter um depois.